quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Adiante

Este é o ponto final deste blog.

Um projeto e uma etapa de nossas vidas que foram cumpridos e, enfim, chegam ao seu termo.

É tempo de ir adiante. Tempo de respirar outros ares, experimentar novos meios de dizer o que não foi dito e de dizer à exaustão o que desde sempre foi exclamado e tem erigido mulheres e homens de peito aberto para o mundo nessa tarefa absurda de dizê-lo, transliterá-lo nesses caracteres cheios de história de uma língua apodrecida pela burocracia que deu à luz, no campo de batalha e de conquista, outra língua, inculta e bela, rude e bela, difícil e bela: a língua portuguesa.

Mundo esfíngico.

Há tempos esse mundo nos chama, àqueles de olhos e corações abertos para o seu cotidiano encantamento, a decifrá-lo, a respondê-lo e a perseverar, acima de tudo, na “luta vã” que é a de empunhar verbos e substantivos cheios de qualquer solidez ou imaterialidade no dizer e redizer da palavra, do verso, da oração, das orações, das mãos unidas em desespero a clamar ao que se crê a resposta.

Decifra-me, pede-nos o mundo.

Em busca disso, nos despedimos, a flor, o cacto, Nadya, eu (Geraldo), nossas poucas palavras e muito do que não virou palavra, que virou algo entre a matéria e o sonho, algo entre nós que nunca irá estancar: nossa seiva.

Fica aqui um forte abraço e o convite a visitarem, vez por outra, nossos blogs:

www.outraliteratura.blogspot.com (de Nadya) e www.ojardiminvisivel.blogspot.com (de Geraldo)


Geraldo Jr.

13/10/2011

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Travessia norturna

Eis que surpreso atravesso a noite

A noite em que não imaginei caminhar

A noite em que não imaginei imaginar



Eis que uma luz assemelha-se aos meus passos

Lado a lado

Vamos



Eis que tudo era nada

E o vazio



Tomava

Tomava

Tomava conta


Da minha caminhada



Os sinais sem reflexão

A falta de Lua à noite

A falta de Luz nos dias



Que viriam depois

O estilhaço nu

Há pedaços do homem por todos os lados

Há pedaços de nós em fragmentos de tempos,

tudo o que nos vem à mente...



Quantos sonhos, quantas vidas

quantos sorrisos em vozes e

formas que ninguém mais viu...



A serenidade das noites ao seu lado

o furor de lábios apaixonados

a aurora insistindo em aparecer....



Dia após dia...



Semana a semana...



Há pedaços de mim por aqui

Há pedaços seus espalhados sobre meu peito

na insegura noite, quis te segurar



Para sempre

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Clair de lune

Debruçado em meus pensamentos
penso nela
notas cálidas, breves, profundas
chamas que em meu peito apavoraram...

Meu rosto de criança, meu sorriso
perdido em meio à multidão, ao frio,
em meio à grande cidade que come sonhos
que comeu os meus, que talvez tenha os dela comido também...

Como, se ao cair da noite, penso nela?
Como, se ao debruçar-me na janela, vejo-a

Nua

Branca

Marcada por guerras e ideais, inteiramente branca,
inteiramente só.

Seus dedos percorrem meu corpo
Seu sabor inebria meus sentidos

Deus, quisera entender o que me causa sua imagem
Sua luz, sua frieza, seu furor, sua rubra luz ao cair da noite em dias insuspeitáveis de fogo intenso em dias frios, frios e secos e sérios...

sérios demais

Lua rubra, vejo-te das pontes partidas em cidades inóspitas

Vejo-te em noites incandescentes de furor e loucura!

Vejo-te, nua, Lua, vejo-te inteira!

Desejo teu gosto em minha boca sedenta de desertos imemoriais...

Dos passos que dei, tua cor… teu cheiro, teu sabor...

Lua, Lua, Lua, sobe ao céu mais esta noite

Somente nesta noite, atende ao meu clamor!

Danço, canto, circunvoluo meu corpo, meus passos, meus sonhos… tribal, Lua...

Lanço-te o grito ancestral: faz de mim amor e mais nada.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Revisão I

Coloco-me frente à frente
com a folha de papel.
Como riscá-la, palavra,
como acreditar que seus
traços foram em vão?

Decuido grotesco de mãos
sem razão, cuidado, culpa,
dor mesma de verter em
palavras que não calam

Como arriscar tornar-te
compreensível, palavra?
É tua vontade querer dizer?
É tua vontade querer ser?

Ah!, Palavra, risco-te pela necessidade
Risco-te sem ao menos poder em
silêncio
chorar um poema perdido

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Palavra: o nado inanimado

Aos poucos as palavras vão se afastando de mim
Notoriamente seus segredos não me querem se revelar
o que sinto, o que julgo, o que penso, penso, penso
sinto-as endurecer e se esvair rápido demais

Não há pensamento,
não há desejo e Drummond já me alertava
que não
bastava, que não era poesia e a poesia...

sem perceber eu a lia rápido demais e a rapidez se fez fera
e a rapidez
tomou meu corpo,
tomou meu sonho,
tomou meu universo líquido a mil por hora,
tomou o som
e emudeceu.

Tomou o significante,
tomou o significado e tomou a mim.

Agora, nado, nado no oceano de palavras mortas que não esperam
inanimadas
não aguardam
nada
de mais de mim e sacudo-as:
FALA!
grito em desespero que me surrem o rosto (ACORDA, POETA), que me [raspem o coração até sangrar e arder muito pra que eu possa, enfim

Palavra

sexta-feira, 23 de abril de 2010

A ilha (na ilha)

Uma ilha vazia

Restam nela, perdidos, traços incomuns
Algo espesso, como uma barba espessa
Algo claro, como pele clara
Algo fechado, como olhos fechados

Na ilha há a tristeza de quem esteve e não mais está
Na ilha resiste às imagens o tempo
Na ilha resistem as lembranças de que foram humanos
(Fomos humanos talvez)
Na ilha resistem cheiros e lembranças
Na ilha resistem os irmãos e as vozes a ecoar do primeiro grito
Grito absurdo! Que dói! Dói!

Na ilha resistem fragmentos de histórias-sem-fim sem fim em si mesmas

Na ilha contam-se histórias absurdas de estradas e carros e gentes
Na ilha contam-se histórias absurdas de trens e vagões no calor
Na ilha contam-se até histórias de amor
Na ilha nada mais há
Na ilha resta a ilha
Resta o nada na ilha
Resta o eco na ilha
Restam os traços na ilha
Resta o endereço na ilha da ilha

Da ilha nada mais resta
Na ilha há apenas
A ilha

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

O Tempo

O tempo são vias respiratórias
Paradas em sua elasticidade
O que muda não é o tempo
O que muda é o ar

Tudo novo, novos ares
Novos tempos,
Acho mesmo que dias melhores virão
Se chove, hoje chove,
Se faz calor, hoje não faz, mas amanhã teremos sol

Amanhã teremos sol.

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Às vezes, mãe, às vezes, pai...às vezes entre... entre

Algo existe lá fora, neste momento. Penso em ser a garoa que cai fina, por onde moro. Penso em ter demarcadas as minhas aflições em minha face, por isso choro. O socorro de onde vem? Agora, já não mais pergunto. Sinto, sei, existo e vivo tudo isso.
Entre, professor, entre.
O caminho tão sofrido. Pai, mãe, sofri como um cão. Agora chego a pensar em outras coisas... o colorido das vozes dos rapazes que jogam futebol e que têm o Sol por cima deles e o chão onde pisar.
Penso em meus pés. Às vezes, vezes às vezes, pensar em não pensar e sentir-me pensando. “- O que faço aqui, meu Deus?!?” Sorriso bom, não estou mais lá nem cá.
Chego ao ponto de que partia, Carlos, a vida liberta-me e vivo livre. E as notícias, pai, mãe, são boas.
A tempestade passou. O correio já chega por aqui, a internet também, foi ontem. Ontem mesmo eu vi meus olhos na velha fotografia da gaveta da mãe, pai. Como eram distantes os olhos meus, Pai. Agora, perco a hora, sempre eles se encontram nos relógios, nos compromissos...
Eram próximos, Mãe, eram próximos, Pai.
Algo existe ao luar, neste momento, penso serem casais que se amam em fervor à luz e à sombra da Lua. O cheiro do orvalho os enebria... sei, sinto, tinto sangue os vive em vida e ainda os solitários esquadrinhando a solidão das calçadas vazias à noite, andam e vejam só, estão sós...
Quando acordei que cresci, restaram saudades, aprendizados e esperança.
Entre, pai, entre, mãe... Entre.
A vida se me mostra, sulcos em minha face. O mar se abre adiante sobre o mundo.
Sinto, sei, existo e vivo.
Entre.

Pedaços de mim...

Pedaços de mim que caem, boiam pelo mar
Indo adiante como quem voltará um dia, soltam-se infinitamente
Uns dos outros e tomam o horizonte...

Agora, voam... simples como a indefinição do lá...
Voo como o mar

Se me ouves agora, sabes, mais ainda que antigamente,
Nada mais resta sem sentido
Cada pedaço e cada gesto afim

Tudo boiando pelo e voando como
Tudo voando pelo e boiando como

Eu mesmo

Pedaços de mim voltam, simples como o mar

Tudo, um dia, chega ao mar.

Primavera de 2009

Depois de longa estiagem, um novo texto.

Antes de tudo, porém, eu gostaria de tornar pública minha admiração e incompreensão das grandezas que envolvem Cactos e Flores e que envolvem Flores e Cactos.

Expressa essa incompreensão, necessito de expressar minha contemplação absoluta do fato em si e de como ele diz, somente só, alheio aos fenomenólogos... somente... sem Kafka, Paulo Coelho ou Jorge Amado...

Aqui estou. Aqui vivo. Aqui sinto. Aqui vejo um Cacto ter uma Flor e vez ou outra uma Flor ter um Cacto.

Dois minutos bastam.

Quem tem quem?

Abstraio a questão. Aliás, esqueço-me da questão. Aliás,

Têm-se e são assim, quase Caeiros sem fim, sem morte, sem dor, sem tuberculose.

Cactos não têm frio (e se o têm não demonstram) e Flores vivem assim, como quem voltará um dia. Para sempre.

Cactos e Flores, Flores e Cactos são mais do que assim...

Palavras e plantas e raízes e palavras...

Cactos e Flores, Flores e Cactos são

São para sempre.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

Despedida

A Flor ou o Cacto, eles me perguntam. Ora, é possível dizer de nós, seres humanos, complexos e não-lineares, cactos ou flores? A resistência e rusticidade de um não anulam a fragilidade e delicadeza do outro. Há momentos em que acordamos flor e dormimos cacto, como o contrário também é verdadeiro.

A Flor e o Cacto, portanto, não são dois, mas um. Partes complementares, dois lados de uma mesma moeda. Ou deveriam ser. É por isso que venho me despedir desse blog. Falta-nos a devida unicidade, a conjunção que a natureza soube fazer tão bem. Tenho certeza, porém, de que o Geraldo continuará escrevendo com o lirismo e a dureza inerentes a todo ser humano, mas que, como poucos, sabe expressar tão bem.

Aproveito para deixar o link de meu novo blog: http://outraliteratura.blogspot.com

Grande beijo aos amigos,

Nadya

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Escrevo

Escrevo como quem cospe sangue pisado

Vermelho, ainda,
de vida

Amargo, porém,
cor de barro.

Uma aprendizagem

(À Clarice Lispector)

Começastes
Vírgula imbecil
Gritava eu desesperadamente em busca da capitular.

Tiraste-me o início dos olhos, capital e modelar.

Trevava em sangue minha crise em veias alheias a meu coração.

Não sinto
Nada vejo como antes

Terminastes, bandida de certezas inúteis,
Com dois pontos
Verdadeiro e único olhar:

terça-feira, 23 de junho de 2009

Choro

Nesta manhã ouvi um choro

num trem lotado de gente em São Paulo,

ó, Grande São Paulo,

a que bem me queiras levar... não importa...

ouvi um choro nesta manhã

Esquinas tão áspera e pesada

quanto minha angústia em me ausentar

Angústia até, São Paulo, que mesmo me parece já não há

Caminho-te, São Paulo, que me carregas e que carrego por dentro

em que passo sentindo o cheiro de urina das esquinas de teu centro velho...

velho, seco, áspero... vasto – ainda - coração imbecil envelhecendo em tua própria rigidez

na lascívia falida das putas esquecidas a chamar seus tantos Ulisses pra dentro de um bar

Não te queixes na Avenida São João,

nem nas reminiscências da Maria Antônia,

São Paulo, Grande São Paulo: o furor juvenil,

o furor juvenil, ó imensa Metropolisolidão,

- afogo-me, agora em um soluço-

afogado pelas luzes dos cinemas stadiums, neutraliza-se...

não sei...

acho que já não há

Que seja, aterradora comoção humana!...

Ouvi um choro, São Paulo, tão mais romântico...

Ouvi a flauta doce dos discos do trem a polir em estribilhos o chorinho da manhã que não pedia pra chorar

Mas, choro, São Paulo... um choro, mas foram sim...

São Paulo, foram os bandolins...

Os bandolins que me tocaram o choro no ouvido quase atento

eram os cílios de uma moça

o compasso do balanço do trem,

dedos de cansaço a lhes vibrar e acalmar...

Choro, São Paulo, e embora não me chores

num minuto de silêncio inexistente,

travo em tuas pausas

atormento-me com tuas melodias

grito, se não choro...

que ouvi, nesta manhã, um choro soar.